Você deve estar acompanhando o que tá rolando envolvendo Spotify, Joe Rogan, Neil Young e vários outros artistas e produtores da plataforma. Pra quem não está por dentro, eu vou resumir numa linha do tempo bem simplificada com os principais acontecimentos.
Joe Rogan, apresentador do The Joe Rogan Experience no Spotify (um dos podcasts de mais sucesso no mundo) manifesta teorias infundadas sobre a pandemia. No episódio lançado no dia 31 de dezembro, Rogan teve como convidado um virologista que vira e mexe faz alegações falsas sobre o mesmo tema – e já foi até banido do Twitter por isso. Naquele dia não foi diferente e ele também divulgou falsas informações sobre a Covid-19.
Após o episódio, um grupo de médicos e cientistas – cerca de 270 pessoas – assinaram uma carta ao Spotify, pedindo por uma política mais rígida contra a desinformação. Dias depois, o músico canadense Neil Young, aumentou a pressão ao dizer que a plataforma teria que escolher entre ele e Rogan. Os dois não poderia ser.
Sem se abalar muito, dois dias depois o Spotify removeu conteúdo do músico. A escolha foi Rogan, claro que seria. Desde então, por conta do posicionamento do Spotify, muitos outros artistas e personalidades têm se manifestado em protesto ao serviço de streaming.
Artistas estão tirando suas músicas, podcasters de originais Spotify ameaçando não lançar mais contéudo e até boicote dentro do app teve. Pois é, a banda Belly estampou um “Delete Spotify” dentro do Spotify, na capa da página do grupo.
A resposta? Rogan compartilhou um vídeo de quase 10 minutos no Instagram, onde pede desculpas e diz que o pode fazer é diversificar mais os convidados que recebe. O Spotify, por sua vez, publicou na íntegra as diretrizes da plataforma, disse que foram 20 mil episódios removidos durante a pandemia e prometeu incluir avisos quando um conteúdo envolver o tema. Obrigada por fazer o mínimo, pessoal, mas isso não é nem de longe o suficiente.
Feita devida contextualização, é na análise econômica que podemos esclarecer – não entender ou concordar – a maior parte dos motivos que levam o Spotify a oferecer esse apoio inabalável e incondicional a Joe Rogan, mesmo depois de várias bolas fora – mesmo antes do contrato exclusivo entre as partes, feito em março de 2020.
Se quando assinaram o contrato com o podcaster, já eram públicas as acusações de racismo, misoginia e transfobia que ele sofria, não vai ser agora que eles vão tomar alguma atitude esperada. O pano foi passado já tem tempo e Rogan está sob as asas do Spotify.
Não quero falar sobre o que leva o Spotify fazer o que faz, mas sobre o que realmente está fazendo, que é pagar Joe Rogan – e não é pouco – para propagar falsas informações. Para que alimente discursos infundados e torias da conspiração que, com a audiência que tem, tomam proporções inimagináveis.
Tudo o que não precisamos neste momento é alguém que se manifeste deliberamente, sem nenhum conhecimento, sobre a pandemia. Muito menos alguém que tenha tanto poder de acessar as mais diversas pessoas.
O Spotify é responsável, sim, pelo conteúdo que é compartilhado na plataforma. Não é censura, é bom senso e respeito. É respeito aos médicos e cientistas, respeito aos ouvintes e respeito a outros produtores, podcasters ou músicos, que alegam que o ”modelo de negócios do Spotify tem sido desvalorizar o trabalho criativo e pagar menos aos artistas”.
Muitas atitudes seriam esperadas da empresa diante da saia justa que ficaram especificamente com a polêmica que envolve Rogan e o episódio comprometedor que lançou, menos essa. Agora músicos estão boicotando o serviço, mas quem são eles? A luta deles é com Joe Rogan, uma luta que dificilmente vão vencer se nomes de peso não entrarem na jogada para fazer o Spotify realmente sentir as consequências de suas prioridades. Por enquanto, são apenas mais músicos e produres sendo comprometidos pela reação falha da plataforma.
Estamos falando de uma produção que vale milhões, rende milhões e custa milhões. Uma produção de alto investimento e que tem alcances absurdos. Assim, se a narrativa infundada de Rogan para 11 milhões de pessoas por episódio é financiada e apoiada pelo Spotify, podemos falar em responsabilidade também.